Em 06 de Outubro de 2016, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional a lei do Ceará, que regulamentava a vaquejada, por considerar que o evento fere o artigo 225 da Constituição Federal, submetendo os animais a crueldade.
A Vaquejada é uma atividade "recreativa" onde um boi é perseguido por dois vaqueiros a cavalo, com o objetivo de derrubá-lo puxando sua cauda. Não são poucos os relatos onde os bois têm o rabo arrancado, sofrem fraturas na coluna ou fraturas diversas na queda. Para que o boi, animal costumeiramente vagaroso e dócil, comece a correr em fuga são necessários métodos que lhe causem tormento, desespero e medo. Há relatos, assim como acontece nos rodeios, da aplicação de vários artifícios que causam dor e desespero no animal, a fim de forçar-lhe um comportamento não inerente a sua espécie. Os cavalos utilizados nas provas também costumam sofrer agressões físicas, são forçados a correr pelas chibatadas que levam e sofrem com as escoriações causadas pelas esporas das botas dos vaqueiros.
É a verdadeira exploração econômica da dor e do sofrimento.
Um evento milionário, pago pelos empresários e empresas patrocinadoras dos eventos, que são os verdadeiros interessados na continuidade da atividade que, de acordo com a Associação Brasileira de Vaquejadas (ABVAQ), rende mais de 600 milhões de reais por ano. Uma prática onde um cavalo pode custar até 500 mil reais e em que os leilões dos animais voltados para provas de velocidade movimentam cerca de R$ 100 milhões por ano, que interessa muito mais a empresários e criadores, do que aos vaqueiros em si.
Os defensores da vaquejada argumentam que ela gera mais de 600 mil empregos, no entanto não comprovam esses números, principalmente pelo fato de que um vaqueiro não possui dinheiro para ter um cavalo de 500 mil reais. Além disso, a profissão de vaqueiro, reconhecida pelo Ministério do Trabalho, é a do vaqueiro de manejo de bois, não a do praticante da vaquejada, em si. Em Setembro, deste ano, procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT) e auditores do Ministério do Trabalho, interditaram um Parque de vaquejada na Bahia e resgataram 17 trabalhadores em condições análogas a trabalho escravo.
"A sanção do presidente Michel Temer à lei que eleva o rodeio e a vaquejada à condição de patrimônio cultural imaterial do Brasil (Lei da Vaquejada), na última quarta-feira (30), não terá efeito jurídico prático, mas é fundamental para, junto a outras duas propostas que tramitam no Congresso, legalizar a prática sem deixar brechas para questionamentos jurídicos."
(UOL)
Embora alguns advogados se mostrem incapacitados de entender, houve sim uma manobra política para derrubar a decisão do STF. Há sim uma grande ameaça com o fato de terem elevado rodeios e vaquejadas à condição de Patrimônio Cultura Imaterial, que nada tem a ver com o fato dessas práticas já serem consideradas esporte.
No mesmo dia em que Temer sancionou a Lei 13364/16, Lei da Vaquejada, os senadores aprovaram a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 50, chamada PEC da Vaquejada. Que deixou explícita a intenção do Governo em legalizar a prática cruel de uma vez.
A lei sancionada pelo presidente Temer, de forma isolada, não tem efeito prático algum. No entanto, se olharmos de forma ampla, percebemos claramente a jogada do Senadores pois pretendem, pois a proposta de mudar a constituição é para afirmar que as manifestações culturais, consideradas patrimônio cultural imaterial (rodeios e vaquejadas), não podem ser consideradas crueldade.
Entendam:
- Lei da Vaquejada (sancionada por Temer) - eleva rodeios e vaquejadas à condição de Patrimônio Cultural Imaterial;
- PEC 50 - não se consideram cruéis as manifestações culturais registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro.
Como uma prática considerada inconstitucional pela Suprema Côrte, pode ser elevada a Patrimônio Cultura Imaterial Brasileiro?
Como o presidente Michel Temer, que dava aulas de direito constitucional na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC, foi diretor do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e membro do Instituto Ibero-Americano de Direito Constitucional, foi capaz de sancionar tal Lei, ignorando totalmente uma decisão que julgou prática como cruel e, portanto, inconstitucional?
O Brasil é signatário da Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial, da UNESCO. E O Instituto responsável pelo processo de elevar praticas culturais à condição de Patrimônio Cultural é o IPHAN, que enviou aMinistro da Cultura um parecer contrárioà sanção do projeto de lei.
Além disso, o Decreto 3551/00, Institui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial, determina:
Art. 2o São partes legítimas para provocar a instauração do processo de registro:
I - o Ministro de Estado da Cultura;
II - instituições vinculadas ao Ministério da Cultura;
III - Secretarias de Estado, de Município e do Distrito Federal;
IV - sociedades ou associações civis.
Art. 3o As propostas para registro, acompanhadas de sua documentação técnica, serão dirigidas ao Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, que as submeterá ao Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural.
§ 1o A instrução dos processos de registro será supervisionada pelo IPHAN.
Não através de lei!
Senadores, Deputados Federais e o próprio Presidente da República, movidos unicamente por interesses financeiros, estão massacrando nossa Constituição Federal e toda a legislação pertinente. Além disso ignoram também o clamor da sociedade, pois cerca de 75% da pessoas que votaram na Consulta Pública do Senado, se manifestaram contrárias a aprovação e sanção da Lei da Vaquejada. O mesmo ocorre com a aprovação da PEC.
"Para o senador Otto Alencar, a elevação a bem imaterial serve também como um argumento para convencer o Judiciário de que a prática deve ser liberada. "O presidente sancionar uma lei e dizer que a vaquejada é um bem imaterial do Brasil é superimportante porque já é um ponto a mais para mostrar ao Supremo. Quando sair o acórdão, vamos entrar com o embargo de declaração, e um dos ministros pode rever o voto. Foi uma decisão apertada, de 6 a 5. O desempate foi da presidente [Cármen Lúcia], pessoa que respeito muito, mas que na época não tinha as informações dos danos que a decisão leva ao Nordeste e ao povo brasileiro" "
(UOL)
Nesse jogo de intereses a Procuradoria-Geral da República (PGR), o Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), o Ministério Público Federal (MPF), outros órgãos, diversas ONGs de proteção aos animais e cidadãos brasileiros estão unidos e contra esse retrocesso patrocinado por interesses financeiros.